Em entrevista ao Olympics.com, a capitã da seleção brasileira de vôlei comenta desempenho na Liga das Nações, analisa seu estilo de liderança, lamenta ‘ambiente tóxico’ nas redes sociais e diz já sentir a falta de Carol
Entre despedidas e renovações, a maior referência da seleção brasileira feminina de vôlei continua sendo Gabi. A capitã esteve na linha de frente na campanha que terminou com a prata na Liga das Nações (VNL) e ocupará esse papel novamente no Mundial, que começa em 22 de agosto, na Tailândia.
São poucos os momentos de descanso e muitas as cobranças pela falta de títulos da seleção nos últimos anos, apesar do time estar constantemente em pódios. Gabi, que entrou na VNL no meio da competição após um período de férias, foi eleita para a seleção do campeonato. Mesmo assim, a torcida brasileira exige mais.
“Converso muito isso com as meninas também sobre o cuidado que temos que ter com redes sociais hoje, pela saúde mental, de não precisar da validação. As críticas fazem parte, dizer que não fizemos uma boa partida, que poderia ter sido melhor. Mas é muito triste ver jogadoras sendo atacadas ou diminuídas”, comentou Gabi ao Olympics.com.
Confira abaixo a conversa com a capitã do Brasil.
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- Olympics: Antes da VNL, você tirou um período de férias e voltou aos poucos, mas a lesão da Ana Cristina fez com que você tivesse que assumir de novo o papel de maior pontuadora do time. Como foi esse torneio para você?
Gabi: Foi a primeira vez que eu tirei um período de descanso maior. São quase 15 anos sem pedir um tempinho. Foi muito bacana que o Zé entendeu esse momento também, até porque, depois da Olimpíada, eu só tive uma semana de folga para me apresentar para o clube. Foi muito difícil mentalmente eu já começar no clube novo. Pela minha cabeça, para começar um novo ciclo, era importante esse descanso.
Eu também sabia que retornando ali no meio do processo com o time, eu sofreria um pouco o ritmo, pra retomar os treinos e voltar ao alto nível. É completamente diferente depois que você fica um mês parada. Então eu sofri um pouquinho na segunda semana e na terceira também para conseguir voltar ao meu ritmo.
E ainda tivemos a baixa da Ana [Cristina], que vinha sendo e será – sem dúvida nenhuma – no nosso ciclo essa força, principalmente no ataque. Então, claro que foi um momento de adaptação, mas é um papel que eu exerço já há algum tempo aqui, então não é uma surpresa para mim. Foi um pouco difícil, porque eu não tive o tempo de me preparar desde o início. Eu sabia que precisava de um tempo maior e que sofreria, querendo ou não. Mas já tive agora um tempo para chegar melhor. Para o Mundial eu consegui me preparar, então já estou aí com o time, em condições completamente diferentes. O objetivo, não só meu, mas especialmente o do grupo, é a gente crescer para fazer um bom Mundial.
- Olympics: Estamos vendo atacantes cada vez mais altas, e você compete com elas com 1,80m. Como você consegue compensar a sua altura?
Gabi: Eu não vou mentir que é fácil. Eu entendi durante a minha carreira que eu teria que remar um pouquinho mais do que todo mundo. Realmente, a minha altura dificulta. Não vou dizer que não seja difícil, principalmente no ataque. A questão física também. Eu tenho que estar muito bem fisicamente para conseguir movimentar o tempo inteiro, porque eu já sou uma jogadora que compõe o fundo de quadra. Então, no passe, na defesa e aí quando eu vou para a rede, eu tenho que brigar com gigante o tempo inteiro.
Eu não tenho dois metros, eu tenho que saltar o meu máximo em todas as bolas, então tenho que estar com a perna forte o tempo inteiro e jogar passando e recebendo muitas bolas. Não é fácil fisicamente, né? Então eu entendi num certo momento na minha carreira, principalmente quando eu fui jogar na seleção, que eu teria que ter um cuidado especial, que eu teria que me esforçar mais que todo mundo. É uma exigência maior.
Então, o cuidado com o sono, cuidado com alimentação, praticamente não sair de casa com as meninas… Eu brinco que eu sou quase uma velhinha, que eu não faço nada, durmo cedo pra caramba para conseguir descansar e me recuperar. Então é o preço que eu pago, né? Se eu realmente quero fazer parte da seleção brasileira, jogar em alto nível, jogar Olimpíada, jogar o Mundial e conseguir ser efetiva o tempo inteiro, principalmente em jogos decisivos – porque eu sei que os times vão me marcar muito bem – eu preciso treinar mais que todo mundo. Não tem uma receita milagrosa, é realmente abdicar ainda mais dessa vida, o que já é difícil. Mas vale a pena, né? Eu quero ter esse papel, eu quero ter essa função, essa responsabilidade.
Olympics: Como tem sido lidar com a despedida da Carol da seleção?
Gabi: Conheço a Carol desde meus 15 anos, então ela sempre foi uma referência como amiga, como pessoa e como jogadora. A gente trilhou toda nossa trajetória aqui na seleção adulta, praticamente juntas. Eu cheguei aqui um ano, dois anos antes dela, mas foram, não sei, talvez 10, 12 anos aqui, de muitas batalhas, de muitas dificuldades, muitas alegrias também. Eu vi muita das coisas que ela passou, muitas coisas que ela teve que abrir mão aqui dentro, e é muito legal de ver a maturidade que ela teve ao se despedir da seleção.
A maneira com que ela fez isso, o entendimento, a maneira como ela se preparou para esse momento. E ela entendeu que é um novo ciclo na vida dela, tem os motivos dela, que eu respeito muito, porque ela deixa um legado maravilhoso. Ela sempre esteve aqui de corpo e alma, deu sempre os 110% dela. As meninas mais jovens também querem se tornar o que foi a Carol na seleção brasileira. Eu morro de saudade, mas não posso ser egoísta, porque eu sei também que ela está num novo momento da vida dela.
Espero que eu ainda possa jogar com ela em algum clube, que ela se aposente com 40, 42 anos.
